Como foi o Beco do Bocão 2019?

É possível que tenham sido os melhores cinco dias da minha vida profissional. Beco do Bocão foi uma feira de artistas de histórias em quadrinhos e ilustração dentro da Feira da Providência (Rio de Janeiro - RJ) e, sob vários aspectos, foi um sucesso. Mais ainda, porque foi realizado com a superação de alguns obstáculos. Foi a primeira vez que organizei um evento de quadrinhos e, agora que está formatado, pretendemos repeti-lo todo ano.




Pela primeira vez, um stand inteiro, exclusivo para venda dos trabalhos independentes de quadrinistas e ilustradores, foi atração da Feira da Providência, evento tradicional das famílias do Rio de Janeiro e região, para compra de presentes e alimentos para as festas de fim-de-ano. A ideia da Superintendência da feira era trazer novidade para o público, na sua 59ª edição anual. A ideia dos quadrinistas era expor suas revistas, livros, posters e cartões para pessoas “fora da bolha”, ou seja, que não sabem que existe esse tipo de artista por perto, ou que não costuma frequentar eventos culturais em que os quadrinistas vendam suas publicações independentes.

Os dois objetivos foram alcançados! O belo estande do Beco do Bocão fez bonito nos cinco dias de feira, chamando a atenção de visitantes de todas as faixas etárias e estratos sociais. Ganhou, inclusive, um troféu como destaque, prêmio criado por um dos expositores, Sr. Isaías, do stand Mais Memória.


Quanto ao resultado das vendas e contatos dos quadrinistas, as avaliações foram de satisfatórias até recordes. Levando em conta que o público não visitou o Beco do Bocão movido por propaganda, mas conheceu os artistas pela primeira vez, comprando por impulso,  os faturamentos foram surpreendentes. O elenco de quadrinistas foi montado para oferecer variedade, representar várias gerações de artistas e atrair os olhares das famílias. O efeito disso foram cinco dias de convívio caloroso e bem-humorado.

Nossa estratégia foi nos aproximar bastante do público passante e mostrar que ali na bancada estavam os próprios artistas que conceberam e desenharam todas as publicações e produtos. Um presente comprado ali ganhava mais valor, com autógrafo e dedicatória (além de um bate-papo atencioso). Além disso, crianças e jovens podiam se identificar com os quadrinistas, ouvir dicas e descobrir uma carreira artística. 

A hashtag #dêquadrinhosdepresente foi a tônica da comunicação nas redes sociais. Para evidenciar que o público encontrava verdadeiros artistas no Beco do Bocão, utilizamos vários cavaletes com blocos de papel onde nós nos revesávamos na feitura de desenhos variados. As folhas eram fixadas nas paredes do stand e, depois, oferecidas aos compradores que adquiriam algum combo



Quanto aos obstáculos, os dois maiores foram a imprevisibilidade do resultado e a inconveniência que muitos artistas sentiram em participar, uma vez que o evento aconteceu nas mesmas datas da CCXP em São Paulo (a maior feira de quadrinistas no país). Assim, o elenco demorou a ser fechado, aumentando a tal imprevisibilidade. Quem participou se comprometeu a expor 11 horas por dia, durante cinco dias, sendo três dias úteis, entre obrigações de final de ano, num local longe de casa para a grande maioria.

As facilidades ficaram por conta da equipe da Feira da Providência, que investiu na nossa ideia e prestigiou a classe com o estande mais digno que um quadrinista brasileiro já viu. Agradecimentos especiais para Clarice Linhares,  Janaína Melo, Rafaela Francisco e Sylvia Lima.

A novidade chamou atenção da imprensa local e figurou no noticiário em vídeo, como nos links abaixo:

• Matéria
no Jornal do Rio (Band) – Primeiro dia.

• Matéria
em Jornal das 10 (Globonews)

• Bom
Dia Rio
de quarta feira, sem imagens, mas com citação do âncora.

• Barra TV - a partir do minuto 3:25



Beco do Bocão 2019

É uma nova experiência. Que tal levar quadrinistas independentes para mostrar suas criações no meio da Feira da Providência? A tradicional feira que antecede as festas de fim-de-ano no Rio de Janeiro sempre tem seu cartaz anual criado pelo cartunista Ziraldo. Esta é a 59ª edição e ele fez todos os cartazes. Assim, a direção da Feira topou a ideia de montar um “beco dos artistas” ou “artists’ alley” bem no meio do pavilhão de exposições.



Ilustrações originais e impressas, coletâneas de tiras, gibis de humor e de aventura, álbuns em quadrinhos e outros itens serão mostrados e vendidos pelos próprios artistas que os criaram. Tudo que for comprado ali, é claro, vai ser recebido com autógrafos e dedicatórias. Falar com os artistas, além de entreter, estimula a leitura e as vocações criativas.


A Feira da Providência funciona de 4 a 8 de dezembro de 2019, das 12 às 23 horas, no Pavilhão 4 do Riocentro (Av. Salvador Allende, 6555 - Barra da Tijuca - Rio de Janeiro - RJ), com dezenas de stands e atrações culturais.


30 anos do gibi O Menino Maluquinho

Em outubro de 1989 estava nas bancas o número 1 de O Menino Maluquinho, gibi em formatinho (13,5 x 19 cm, 64 páginas, papel offset) que é o primeiro desse personagem do Ziraldo. No momento em que escrevo, isso já faz 30 anos. Este relato é um registro para a história das publicações de quadrinhos brasileiras e também é uma história pessoal.


Anteriormente, o Ziraldo tinha topado fazer uma empresa para licenciar suas criações para produtos, mais ou menos como sempre fez o Maurício. Chamava-se Zappin. Por isso, o Menino Maluquinho tinha aparecido primeiro em história em quadrinhos na publicação Revistinha do Ziraldo, com seis edições em 1987. Essa revista era de tamanho maior, tinha seções, personagens e desenhistas variados. Não era, estritamente, um gibi. Foi interrompida e a Editora Abril preferiu que Ziraldo fizesse um gibi propriamente dito. Entre uma publicação e outra, a equipe do estúdio Zappin foi mudando e até a concepção da turminha de crianças foi amadurecendo. Os nomes das amigas do Maluquinho, por exemplo, foram trocados. Junim, Lúcio, Herman e Shirley Valéria surgiram. 

Outra coisa aconteceu: a direção da Zappin buscou reforçar a equipe, porque teria que produzir as tais 64 páginas mensais de histórias inéditas. Ziraldo já tinha chamado para o grupo artistas experientes, como Heucy Miranda (membro da equipe que fazia o gibi Pererê nos anos 60), Stil (animador e ótimo criador de roteiros), Ferreth (cartunista, ilustrador de mão cheia) e os especialistas em letreiros Jair José da Silva e Mauro Ernesto de Oliveira. Também tinha o Paulo Paladino, desenhista descoberto pelo Ziraldo, que ficava mais nas ilustrações de produtos do que no gibi. Mesmo assim, a Zappin resolveu publicar um anúncio na seção de classificados do Jornal do Brasil.



Pelas tramas do destino, eu, Mig Mendes, que era um estudante de Jornalismo nos seus últimos períodos, e não costumava procurar por emprego dessa forma, vi o anúncio. Isso mudou completamente os meus planos de vida, porque não acreditava que existisse um meio de fazer uma carreira profissional em quadrinhos (anos antes, em visita à Rio Gráfica Editora, fui aconselhado a não tentar essa loucura). Eu não tinha a “experiência profissional” exigida no anúncio, mas tinha feito quadrinhos amadores a vida inteira. Naquela altura, já tinha uma pasta com dezenas de páginas de quadrinhos de personagens próprios, apenas esperando publicação. Foram amostras deste tipo que eu levei ao Sr. Antonio (nosso Toninho). Lá na Rua Alegrete, 29, no bairro das Laranjeiras, Rio, recebi a missão de criar uma pequena história com o Menino Maluquinho. Inventei 5 páginas, finalizei com nanquim e levei para a Zappin. Uma semana depois me chamaram pra falar com o Ziraldo. Ele me falou muitas coisas, mas só precisamos saber agora que ele fez algumas alterações no meu roteiro e disse que já estava bom para publicar. De fato, meu teste acabou saindo no número 3. A partir daí, meu sonho profissional se realizou e decidi me dedicar à criação de roteiros para o gibi que sairia alguns meses depois. Eu ainda não podia realizar os desenhos, mas já ia treinando. Junto comigo entraram na linha de produção outras pessoas, como a professora de artes Jacqueline Martins, autora de inúmeras histórias da turminha, e Ivo Kós, hoje animador nos EUA, que entrou como editor do gibi. A equipe que fazia o gibi ainda seria engrossada com o desenhista Marco A. de J. Ferreira, o nosso Marquinho, que fez uma parte considerável de toda a nanquim dos nossos quadrinhos. Ele veio da Rio Gráfica Editora, assim como Fátima Valença, a nossa Fafá, editora que substituiu Ivo Kós. Com relação aos roteiros, várias pessoas colaboraram no gibi desde os primeiros números.


Primeira historinha do Maluquinho #1 , O Plano Econômico (roteiro de Mig)

O primeiro número de O Menino Maluqunho em Quadrinhos, pela Editora Abril, começava com meu roteiro Plano Econômico, desenhado pelo Heucy e finalizado pelo Ferreth. Era uma brincadeira com a hiperinflação que era nossa sina cotidiana. Depois vinha Zimblóvia, fantasia louca do Stil, desenhada pelo Paulo Paladino, com esboços do Ziraldo. Esboços do Ziraldo também em O Carisma, que apresenta Julieta e seu pai pintor. Em seguida, a primeira publicada de Jacqueline, chamada Adivinha quem vem pra ficar, com desenhos do Heucy. Depois, uma história muda do Bocão (”Cadê?”) e a safadinha A alma do negócio, uma de muitas comédias na sala de aula (naquele tempo a Turma da Mônica não tinha ainda ido à escola nos gibis, mas o Maluquinho ia toda vez). Pra continuar, a estreia de O Menino Mais Bonito do Mundo, um personagem à parte da turma, pois trata-se do primeiro homem do paraíso, Adão, quando era menino. A história chamava-se A maçã ilimitada, com participação necessária de outro personagem dos livros infantis do Ziraldo. Com todas essas estreias, a melhor ainda estava por vir: A garota nova, apresentando a personagem Shirley Valéria, aquela lourinha. Pra terminar as 64 páginas, outro roteiro meu: A fórmula da Cola-Loca, em que o Maluquinho encarna seu lado cientista louco.


Esta é a página de expediente dessa edição.



A revista continuou até a edição 70, passando por algumas mudanças gráficas para viabilizá-la nas bancas, numa época de situação econômica insana. Com o tempo, eu passei a desenhar várias das histórias, a fazer as tiras diárias para jornais e, eventualmente, virei o editor, ajustando roteiros e fazendo o “espelho” das páginas mensais. Esse gibi ainda foi sucedido, depois de uma interrupção, pela revista formato americano Revista do Menino Maluquinho (com quadrinhos e outras seções), mas isso já é outra história. Em 2005 Maluquinho, Julieta e Junim reaparecem com muitas novidades nos gibis feitos pela Editora Globo, que detém os direitos de publicação atualmente.


Linha do tempo das publicações estreladas pelo Menino Maluquinho:

Copyright 2019 Mig Mendes

Using Format